"(...) Saúdo-os e desejo-lhes sol / E chuva, quando a chuva é precisa, e que as suas casas tenham / Ao pé duma janela aberta / Uma cadeira predileta / Onde se sentem, lendo os meus versos. (...)" (CAEIRO, Alberto. O guardador de rebanhos)

sábado, 24 de julho de 2010

Este é um poema que, pra mim, não deve ser comentado... é só ele... sem mais palavras. Só o respiro fundo, desde minha adolescência:

HOMEM COM MOCHILA

Homem com mochila no mercado, Irmão,
como você, sou homem burro, homem camelo,
homem anjo. Sou como você.
Nossos braços são livres como asas.
Comparados conosco, todos os que carregam cestas
são escravos de escravos, sujeitos e humilhados.
Nós trocamos moedas por verduras frescas,
e para o esquecimento de nossas vidas compramos
frutas e suas memórias, memória de campo e jardim,
memória de cheiro da terra e do zumbir das abelhas em dia de calor.
Nós vimos uma mulher num vestido leve de verão,
antes de um amor longo e intenso,
que determinará a sua vida. Ela não sabe ainda.
Nós sabemos. Em nossas costas
carregamos o fruto da árvore do conhecimento.
Homem com mochila, você vive onde?
Eu sou como você, vivemos nas distâncias
entre o prêmio e a punição.
E como nós vivemos? E como à noite nós dormimos,
em que sonhamos? Os que você ama,
ainda vivem nos mesmos lugares?
Nossas mochilas, como paraquedas fechados
em nossas costas, abrem de noite
para podermos saltar, e pairar
sobre a fragrância de lembrar e esquecer.

©Yehuda Amich
(tradução de Millor Fernandes)

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